quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Difícil instalar qualquer coisa de firme e consciente, qualquer coisa que revele uma viagem espiritual, que manifeste uma firmeza de decisão constante…
os rabinhos dos nervos...e, então quando tremem… ou seja, se estiver a olhar alguma coisa, por exemplo, assim, os rabinhos tremem…

sábado, 28 de novembro de 2015

Quando me visito, o que há de branco que faz os olhos flutuarem desespera por economia - por exílio na Tebaida, sem saber se é nas quatro paredes manchadas pelo mofo em que habito.
Algo me impele para o outro lado. Sobretudo o excesso de claridade do verão, em que tudo é desfixo. A possível luz que vem das vitrines está noutro porto - aquele do outro lado do mar. E tempestuosa é a travessia, como se ela se movesse e eu não me mexesse.
Ouço o caminhar de cada criatura que divide comigo as noites e os dias ao redor do pequeno barco. Deixo-os, mesmo quando quieta, continuarem a me acalmar. Isso nunca havia acontecido. 
A organização do quartinho é à deriva. É necessário movimentar-se muito - alguns peixes difíceis tem olhos grandes e redondos, mas as cabeças parecem se ajustar - observo. Já por mim, é muito intempestuoso reclinar a cabeça na madeira macia. A mulher pensativa não pode dirigir-se a janela sem chorar um misto de saudades da vizinhança e exigências do amor. É possível apenas um abraço de anseio.
Parece-me o auge não enxergar o fundo da pequena baía em que me encontro. Penso em arrastar no lodo inicial, todo o sangue que guardo comigo e instruo-me a não dar importância - ao remar com o bambu encontrado ainda na margem. 
Espero livrar-me do típico caráter de atribuir a travessia a uma tampa, como se lembrasse que abaixo dela estão as constantes reconciliações vitais consigo mesmo, cozinhando.

terça-feira, 10 de novembro de 2015

Calcar a terra, pressionar-pisar-apertar, desprazer-oprimir o começo é o final de tudo, incha e desincha
queima a cana plantada nos rostos brasileiros. A pedra limpa a chapa queimada... 
onde foi cozido o material alojado.

sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Exílio parte 51

Quando algo aproximou-se saindo da opacidade, mais lento que nós próprios, por assim dizer, o espelho não acreditava naquilo e sonolento como é, não repetia o que dizíamos a sua frente. Ele fica na sala arredondada inesgotável, com espíritos circulares dispondo de tempo e memória.
Comeram todos os cartões de visitas, comeram minha dor de cabeça, comeram tudo onde grafei meu nome. Restaram algumas carícias afetadas no primeiro estágio elétrico do sono, observações atrás da cavidade ocular que conectam-se aos campos do inaudível: persigo minha verdade emocionada oculta no frágil biombo do despertar de sensações. “A misteriosa fraqueza no rosto dos homens”, lembro de Sartre.
Na minha volta, natimorte dos desejos. O que pergunto-vos? As mesmas palavras. O que sabem a mais? A informação de controlar uma ação. Não tenho parâmetros (bola igual quadrado vezes x é a própria saia, que fez-se ouvir um murmúrio, brado de suas pregas, num roçar de sortilégios) para medir a falta de separação dos gestos jogados no mesmo saco. Não acesso teu padrão; finges que és estruturado? O jogador da manhã é diferente do amante noturno. Acompanho teus movimentos natatórios em que sou sequestrada - te dissipas - e não passas ao lado das 399 camas (de um modo geral, a morte individual não é algo tão bem feito, mas isso também não importa. Quem ainda dá alguma coisa pela morte bem acabada?).
Reclamo comigo mesma, que meço distinções às cegas.
Espere, sobre o perecer do conhecimento - que é prurido.
Apareça, apenas para a saciedade do perfume.
( Os melancólicos sorriem como dançarinas ao terminar as piruetas à maneira dos ursos enjaulados.)

quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Exílio parte 50 (!!)

Espremendo-me por vários mundos, tento fundi-los numa mesma atmosfera e sou sequestrada.
Meu corpo desce escada à baixo, após ouvir a música que vinha do salão principal - que mesmo entorpecendo-me paralelamente - é onde encontro meu centro de utopia: para o fantástico, para o aspecto rítmico, para o tipo dançante e pouco espaçado.
E... onde nós estamos, quando a onda fria chegou?
Desopilo em posição convalescente, de costelas fraturadas: as superiores trincadas, as flutuantes quebradas.

Exílio parte 49

Atravesso mancando minha desacoplação, término de um ciclo arcaico de meu espírito. Sinto o portal nas proximidades, derramando sobre mim a solidão gostosa que é a de ausência de concentração. Não é para a consciência plena que a vida caminha, mas para a evolução subjetiva - aquela íntima.
O gosto amargo e pesado da lástima, aceito ressaltando sua extinção no menor tempo possível. Meu perfume fora imperceptível em sua florescência - doce e excêntrico ao extremo. És a pintura do macabro! Adornado de dourado - puxando amarelo de gema de ovo na moldura. Não sei dizer a quem pertence o quadro, por que não conheces a ti mesmo.
Caira a chuva grossa, arrancando-me da saleta transbordante de peças de um xadrez alquímico, obtuso. No preto e branco, o xadrez é de magia negra: ilimitado voodoo com peças de carne fresca. Vence o mais usurpante.
Gravo em braile na testa!”

Cubo

No interior de um cubo de vidro era possível ver a vida passar sem som, sem cheiro.
A única coisa que parecia estar em sua companhia, era um sentinela que todo o tempo certificava-se de que a caixa estava bem vedada.
Ele a alisava  sobre as granadas de descanso em seus lábios. Suspirava quando ela percebia seus olhos atormentados, as mãos escorregadias sobre o joelho direito armadas.
Eram amantes... através da janela.
A chave era parte de seu corpo.
I
Exalo um punho de recordações, vindas do intemperismo da madeira
em uma sala muito lustrosa e nada insípida.
Revirara o mundo dos sonhos, suara o corpo em transparência etérea.
Cada qual criando o próprio tempo de perceber
O cansaço, a maciez e o fardo -
e como se a dor fosse um pedaço de pão endurecido, maldizer isso à teus perigos.
Em olhar difuso, repousara comprimindo o que ao amor antigo pertence
Embalando afoita o que envolve a face do outro - como uma manta de sangue empapando minha vida.

II
A falta é a febre interna
O esguio, o lânguido, o todo -
é o retorno do amor isolado.
Há inflamação das glândulas, tentando acalmar e construir o acalento ao coração desesperado de apego.
Há o costume da conspiração: de abismar os olhos e beber do vinho mais seco, em refúgio que vem rindo e blasfemando, perto dos violinos tensos que alçam voos ao redor de nós.
Há o sincero e recíproco dia, valvulado e lotado de reverbes que pairam sobre as mesas impessoais.
Há a roupa larga que comprime o peito,  emudece os sentidos e pisca a faísca no ouvido:
a ansiedade é a mãe de todas as cóleras.

III
Penso em tua mão para impressioná-lo, trazer paz através do esguio em que tu te moves e na dança arruaceira em que vais
Não é o que dizem que nos machucará mais
Isso é sobre nós quando não pensamos em outra pessoa.
Todos um só peito inflamado,
precisando saber que não somos uma só consciência.


IV
Batidas contrapõem-se ao submundo que habitamos:
não despenques na modéstia da alegoria excessiva!
Os algarismos básicos de um a dez nunca mudam -
múltiplos plurais dos mesmos e eternos números.
Que sejam ausentes os assovios cansativos, que descem a rua em amputação

de um tempo já irreal.

Solfejos e ausências, falências subordinadas nos corpos peregrinando, nas frases inúteis presenciando a morte - que não sabe-se onde tem início, meio e final. De lábios tortos os campos audíveis variam do medíocre ao quase divino - mancomunamos concertos em pensamento, nós, queridas presenças, de fortes exércitos erguidos de panos quase impermeáveis: apenas jovens barracas suscetíveis ao acaso da natureza intempestiva. Somos nós, pequenino público, talvez preso nas comas que não pode-se ler nas partituras com clareza.

A paz parecia regressar a interioridade.
Mas ela olhava com encanto tal que magoava-o.O homem usando um soslaio de risca de giz antiga, roçando nos cabelos dela. Chamam seu nome de repente - ou sonhara com isso? Escuta e imagina, afinal, tudo o que quer.
Alma de passarinho, ornamento da própria luz que voava. Olhou pela vidraça, desejando que seu corpo transparente fosse tomado. O silêncio do desconhecido é sempre um desejo.
Mas ficaram em círculo comum e o silêncio deu um nó em volta.

Exílio parte 48

Estava indo embora, observando-te em silêncio, sabendo que após aquele encontro meu coração já não seria mais o mesmo. Pode ser só um sentimento ruim a menos, pois oscilo entre o entusiasmo e o sossego daquela paisagem em que coisa nenhuma pede urgência. Fiquei presa naquele infinito; mais nas longínquas vizinhas que não dormiam.
Somos daquelas pessoas que passam e se olham inevitavelmente, abrindo os olhos com um doce intencionado, tentando abraçar cada feixe de luz que do olhar escapa.
Experiências que respingam; anunciei-me tratando de não fugir aos dias. Minha cabeça é como o artista de circo que não descobre o equilíbrio para andar no canal enlameado. Sua o corpo, amarrota o sorriso e não importa-se de balbuciar como criança seus lamentos de sina. 
Nutro minha hera nos detalhes. Observações atrás da cavidade ocular que conectam-se aos campos do inaudível: persigo minha verdade emocionada oculta no frágil biombo do despertar de sensações. “A misteriosa fraqueza no rosto dos homens”, lembro de Sartre.
Atravesse a rua, como a senhorinha e sua bengala no meio fio, e te esperarei apedrejada para um próximo fim. Não sei alimentar-me na ausência de inebriamento; cada passo do garçom na madeira é uma sacolejante negação.
O bisturi da música opera. Já cravada a anestesia, fico sabendo quanto me custará: peço que ao menos avise Lia na sala de espera, já em desalento químico. Ela veio e trouxe a inibição. Trouxera consigo lascas de mucosa infeccionada e penso: amanhã doerá tanto mais!
Não saio e não rezo: espero. Pois seguindo a escola de Vinícius, não desperdiçarei uma gota de álcool sequer. Sobreviver a miséria… Uma labuta vinda da minha nudez, muito lustrosa e insípida, procurando ingenuidades no alto da sapatilha maternal onde não poderia ser menos inclusa nas maldades da vida. Nudez são as consequências? Imagino que nunca a tenhas feito.

terça-feira, 4 de agosto de 2015

Conta-me, cílio

Que óleos calmantes

arranham a superfície das coisas?

A anomia sentimental

Perpetua meus excessos

E doo bem mais do que consigo ser

Na margem que persigo.


terça-feira, 28 de julho de 2015

"Sofro de
Antegozo àquela dádiva
sem nunca chegar à nudez.

Pois quero atestar que este que escorre por minhas vértebras,
dance com tua alma como uma rolha em cima da maré
E uma por uma, afogue cada chibatada em que tu estivestes.

Teu corpo é uma cidade em chamas!
E acordei ao lado de cadáveres
cada vez que tu me deixaste entrar.

                     O amor é a sombra da tua sombra
                     Com a que viaja de copo vazio:
                     É o mar que tu escutas em mim."


Gabriela Carlotto


" A poeira ofuscante, sobre a luz do sol cobre os grãos maduros
Cria longas sombras, na grama ainda dormindo
Ficam deitados contraídos
Calmamente explorando os olhos um do outro."

Gabriela Carlotto