quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Perco-me em devaneios olhando a beleza das sapatilhas de ponta, nesse apelo enorme de delicadeza que causa descontrolável encanto nas pessoas.

Sintomas

A naturalidade de outrora se foi. Reviro as gavetas e não a encontro, nem mesmo dentro doa livros antigos. Penso demais, e só paro quando o desgaste físico mói até mesmo os pensamentos. Ansiosamente aguardo que a rotina impere, que a noite passe - que os sentimentos e desejos sejam asfixiados pela fumaça branca do baseado e logo as esperanças liberadas, a cada respiração tragada (para Amanda).
Grande parte de mim é um leão acovardado que quer apagar seus passos, sempre incertos. A outra parte fica sentindo, querendo, mas é minoria e reprime-se perante o leão controlador - embora não passe de um covarde.
Não controlar os sentimentos me dá arrepios, sensação de pedra na garganta, passagem de ar bloqueada. O "eu te amo" fica trancado no esôfago, remoendo-se...

domingo, 16 de janeiro de 2011

Dúvida

Tudo ia por terra, ao deitar a cabeça no travesseiro essa noite. Depois de tanto tempo, Lia viu-se desprotegida, abandonada por seu escudo impenetrável: cedia em fim ao desejo.
Infiltrando-se por brechas, na espreita da jovem com faro de gato, Getúlio estava sempre alerta para abocanhar sua presa. Não deu-se ao trabalho de procurar uma fenda frágil para atingir seu coração. Frustrou-se como nunca frustrara-se antes. Questionou mil vezes a si mesmo à procura de grandes defeitos, de um motivo qualquer que acalmasse seu coração - mesmo que um fantasioso, daqueles que só se auto-percebe. Achava em Lia a imagem para rezar e pedir que salve o dia, e então algo deveria ser feito.
Lia não encorajou-se para admitir estar sendo vencida. O grán finále esperado para o engenhoso plano traçado, nunca veria o fruto de seu trabalho na prática - jamais sairia do papel em que foi cuidadosamente construído  É um rabisco do céu, no livro da minha história - pensava nosso desaventurado amigo. Mas como disse, Lia estava sendo vencida e podia sentir o medo descer pela coluna e deslizar pelas pernas bambas.
São muitos riscos na tocaia, esperando seu passo avançar para apossarem-se dos cacos de quem já tanto sofreu. Lia andou, e agora não sabe se para frente ou para trás.  Crê que sabe distinguir pensamentos mirabolantes dos reais, mas a dúvida persiste. E insiste.
Nessa noite o estranho e inimaginável tomam conta do quarto pronto para dormir- o arrependimento baterá na porta? Quando o coração está no ringue, surge o pavor de ser nocauteado e jogado para fora sem mais delongas...

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

O amor ainda é latente, e a dor- com suas mudanças temporais é meu suplício persistente.



quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Lia e o mar

O ruído do mar é o único preciso. Lia pára, procurando no horizonte um banco de areia onde possa ficar em pé e não mais refém da onda, à mercê de sua própria segurança.
"É a voz dele em uma das brisas!" Avança oceano à dentro para defini-la, separá-la, tão adaptável! Parece homogeneizar-se competindo com o tom grave tatuado na memória dela.
Por que sempre perceptível, nas beiradas atrás de cada instante vivido? Voz em que agarrou-se e continua presa (pelo mar). Enfim Lya completa, obstruindo os ralos : gosta de salgar o corpo com água e ouvir o vento arrastando as notas musicais depressa.
Ela descobriu os cantos - onde sempre o achou- e permitiu desde então que tudo o mais a arranha-se, pois seu luto e saudade sobrevivem sugando a força vital.

Proteção aos animais


Respeito pela vida dos animais é o mínimo esperado das pessoas em geral, e tratando-se da classe médica veterinária a questão é indiscutivelmente mais séria. Questão de ética e profissionalismo.
No momento em que confiei meu amado felino Syd às mãos de um veterinário, imaginei que não fosse necessário lembrá-lo de que entreguei uma vida, e que como o ser humano possui fragilidades e sua saúde deve ser sempre preservada. Acredito que a clínica em que deixei Syd seja mais uma de tantas que visam nada mais do que renda. A situação torna-se ainda mais grave quando essa empresa passa à ingressar em campanhas de proteção aos animais, oferecendo serviços à baixo custo: com menor remuneração, o descaso com os bichinhos é revoltante.
Como tantos outros, Syd fez parte de uma feira de adoção de animais de rua, onde recebi a indicação do local para fazer a castração. Julguei ser o melhor para ele, ainda que o receio e o medo me angustiassem. Apesar de ser leiga, sabia que a esterilização em machos é extremamente simples, quando recebi a notícia de que nele havia uma complicação- só um testículo era visível. O procedimento para detectar a existência deles é fácil, feito antes de qualquer anestesia ou semelhantes, mas ele não foi examinado, apenas sedado e colocado na mesa de operação, onde o problema foi descoberto.
Sem escrúpulos, o médico prosseguiu com a cirurgia, cortando Syd sem saber a localização exata do órgão, que quando interno, toma diferentes formas. Disseram-me, friamente, que quando marcado um procedimento, ele é executado. Creio que em casos especiais o protocolo deveria ser quebrado, para antes os exames específicos serem feitos. Claro que como Syd fazia parte do programa de doação  não adiariam a cirurgia ou se preocupariam com quem nem mesmo enche seus bolsos.
Não há explicações para a dor que senti ao vê-lo! O descaso é visível já em como o corte foi vergonhosamente fechado. Nenhuma instrução me foi passada, nem ao menos vi o rosto do veterinário - jogaram-me o gato como livrando-se de um problema. Um problema que sente dor, contrai infecções, sofre. Era noite, não tinha dinheiro e tive de cuidá-lo como pude.
Pela manhã procurei outro veterinário, que ficou atônito ao término do meu relato na sala de consultas: "É incrível como essas pessoas podem se dizer médicos, sujando o nome da profissão com tais atitudes, aproveitando-se de leigos", disse.
A recuperação está sendo difícil. E pensar que todos os riscos que Syd corre a cada minuto, poderiam ter sido evitados com o simplório ato de respeito com outro ser vivo.
29/12/2010