quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Podes escutar, na calada da noite,
O eco dos meus gritos de dor que as paredes absorvem?
Ou serão, gemidos de amor desesperados,
Indecifráveis fora do meu coração?
No vácuo, o gongo dispara em sua violência
E o sol tornou-se sombra - os olhos podem permanecer adormecidos
Pois os minutos correm como ratos assustados, e logo tudo volta a ser essa calmaria colérica
Que é o sonífero da minha angústia.
19/08/2010

Afastando-se

O ar está pesado e denso demais para ser respirado. Nem mesmo as ondas sonoras chegam até aqui - o único e atormentador som existente é aquele que, há tanto tempo, ecoa dentro de mim.
Preciso escrever, talvez deixar uma mensagem para se, por ventura, algum dia encontrarem esse lugar. É estranho, pois estar aqui é estar esquecida até mesmo por Deus - as paredes parecem ter em sua memória a história do universo. Com seu silêncio petrificado observaram e resistiram anos à fio evolução à dentro. Agora estou aqui, e finalmente posso chamar algo de "meu" e somente "meu" : Minha caverna onde não há amanhecer nem crepúsculo, e não existe diferença entre manter os olhos abertos ou cerrados.
Minha, sim. Feita de rocha bruta, com seu aspecto macio ao tocá-la levemente com a ponta dos dedos. Estar aqui e conquistá-la é tudo o que obtive na minha caminhada em declive pelo mundo lá em cima, onde os dias passam um após o outro inevitavelmente  Arrisco traçar alguma palavra na parede à cego, mas minhas unhas são frágeis e não resistem ao atrito com a pedra : Minha mensagem, assim, será um montinho de ossos bem colocados, pois aqui não há vento algum - como disse no começo, só há um ar denso e irrespirável.
No escuro estou condenada a somente ver oque meus pensamentos querem e que a imaginação dá vida. Começo a achar que não morrerei sufocada ou de fome, e sim, de angústia - a nostalgia também mata. É um mal que, tamanha sua força, destrói a alma e o plano físico. Penso: Relaxe, a dor está no fim, e logo não sentirás os lábios sedentos dos beijos de outrora.

18/08/2010
Uma história de paixão desigual -
ainda o amo mais intensamente do que ele jamais amou-me.

18/08/2010

domingo, 8 de agosto de 2010

"... como uma louca a noite mentia de dia... "
(Clarice Lispector, "O lustre")

Colcha de retalhos

Sinto-me o último desgraçado na fila para o céu ; sinto-me um mortal esquecido por Deus -até mesmo por ele, que como papai noel, dizem não esquecer de ninguém. De tanto ser reduzida, tornei-me poeira, mas não foi suficiente -em um lento e tortuoso processo fui refinada, refinada: Agora sou menos do que ninguém e mais leve, fina, insignificante e pequena do que um grão de poeira.
Nada mais acalma a angústia, que, como um câncer, hoje percebo que se alastrou devorando as partes ainda sadias. A cabeça dói como jamais antes doera: Será que a morte finalmente cansou-se de levar pessoas inteiras e lembrou-se de meu endereço? Ah! O destino é meu inimido invisível e intangível de todos os dias: Costumo dizer que ele gentilmente prega peças em mim.
Não descanço à dias, o sono é algo tão superficial que é quase controlável. Estou com a cara de zumbi habitual, em inércia. Preciso de força, ânimo! Porém as correntes prendem-me -ou será que não? Eu posso ser a própria corrente.
Quando darei mais um remendo no meu tapete e continuarei a andar, ainda que por alguns dias? Queria muito mostrar-lhe, caro papel, que bela colcha distinta é meu interior: São tantos buracos remendados com os mais diversos pedacinhos de tecido. Na verdade, ela já é assim por inteiro, e talvez agora seja possível imaginar as dimensões do sofrimento -uma alma inteira remendada com seus fios frágeis e paninhos podres. Cada fenda, requer tempo para ser costurada: Tempo, tristeza, angústia.
Rezo para que ela se desfaça e seus retalhos sejam espalhados pelo céu -acho que eles merecem uma morada melhor no fim de tudo, pelo esforço de manterem-se unidos.
31/07/2010

Fogo e fungo

Meu coração está apertado, falando por si próprio, domando todo o pouco que resta de consciência.  As forças foram sugadas até o último grão que havia no fundo do último tacho - na tentativa de não morrer de fome.
O amor deixou à muito de ser a chama que aquece, conforta e traz alegria, para ser o fogo que simplesmente queima e deixa em cinzas onde passa - até mesmo seu berço de outrora, amor ingrato! Destrói o peito que um dia, tão doce, o deixou crescer e fixar suas raízes, tão belas quanto traiçoeiras. E, quanto ao veneno, é como um fungo que se alastra e torna a madeira podre.
Assim definho, e esta noite escrevo pois a doença avança rápido. Nem mesmo a luz, de suma importância para escrever, suporto: traço os contornos na penumbra.

13/07/2010
Se a vida fosse consumível, atear-lhe fogo eu iria.