sábado, 22 de outubro de 2011

Lisergia

Era anunciado o momento de partida. Disse-me: "Amor, prepare-se para ouvir o silêncio como nunca antes..." e iniciou-se a despedida, adornada com expressividade alegre. Tua tonalidade de voz era de riso explícito: aquele riso insano e apaixonado que lanças somente aos meus olhos.
Aproveitei a insônia que cerca-me para direcioná-la, deixá-la fazer-se presente longe dos cobertores que deveriam inspirar descanso. Perguntei-te sobre os concertos anteriores, traçando perspectivas sobre o que a apresentação daquela noite significaria - ainda que teu requerimento da minha presença fosse exasperado, e, portanto importante por si só. "Os outros não podem ser considerados shows... Estávamos alucinados e as canções eram uma grande 'jam'."Respondeste-me. "Foram ensaios esquizofrênicos com espectadores." Finalizei.
E lá estávamos, as realidades em lenta fusão; lá eu estava orgulhosamente esposa.
"Amanhã, depois e depois, quando de ressaca eu estiver, vou querer te abraçar e ver que estás aqui. A única coisa que importa é que és o amor da minha vida, agora e depois." e ao término das palavras beijastes minha mão, navegando por minha pele. Não balbuciastes "nunca te deixarei", como de praxe... Será que pensastes, em meio todas as cores vivas, que não sabemos o que nos espera a cada nascer do sol? Creio que a esse amor regido pelos céus não cabe tal característica. Tive medo, a experiência potencializa a sensação de estranhamento, preciso de tuas palavras... Logo surpreendeu-me:
"No próximo gritarei no microfone que te amo e és a mulher da minha vida! És tão bonitinha para tudo isso...Arrume a caixa de som no teu colo, isso, mais confortável... Faça sexo com ela." apertando-me e sorrindo. Disse-lhe, por fim, que o formato quadrado da caixa não atraía-me, logo tendo o diálogo lisérgico cortado pela sinaleira que abria - e percebendo o lugar perigoso em que nos encontrávamos distraídos. A sorte também pode estar ao lado do amor, não é?
Agora preciso esticar meu corpo feito argila pelo colchão e dormir. Não há escuro que vede a pele fina das minhas pálpebras!

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