sexta-feira, 19 de julho de 2013

Junho, em II atos

I Dedicatória
Revirara o mundo dos sonhos. Suara meu corpo em transparência etérea. 
Cada qual criando o próprio tempo de perceber o cansaço, a maciez e o fardo -
todos tão próprios e tão próximos.
Em meu olhar difuso, repouso comprimindo o que ao amor antigo pertence
Embalando à vácuo (em fenda do tempo) e em sonhos afoitos envolvendo a face do amante - 
como uma manta de sangue empapando minha vida.

II Observação
Apaixonado por outra.  
Ela chegou de trem e agarraste-a pela mão, pontualmente as 15h, em uma data qualquer de junho. Cecília é o nome dela, que caíra na peneira sentimental dele.
Houve delicadeza e elogios - palavreado que somente consegue expressar coisas do mundo da forma.
Cheguei à estação quase escorregando na margem dos trilhos, dobrando a esquina, asquerosa em meio a rotina que tanto me consome: dinheiro para fingir-me de independente, dinheiro, para beber até libertar um dos seres que habitam em mim, dinheiro sorteando quem desejo ser.
Pedi aos pombos que ali fatigavam ainda mais a correria, licença para chorar.
Fiz gestos de ludibriamento - e tu de ausência de amor.  
Ocupei meu assento na omissa ocupação de ser amante.
Levou-a para seu apartamento, finamente encubado com todo cuidado: folhas pegando fogo, incenso queimando, perfume borrifado. 
Mas a atmosfera tóxica comprimiu, ar novo não entrou. Cecília sufocou-se em vinte minutos.
Na espreita, o acolhi com o cadáver e disse:
- Observe, é a revoada de fumaça! Preste atenção: leve as cinzas, ajude a evaporar o lodo que contém a água, desove as sementes para a nova floresta.

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