sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Em espera

Preparo-me para deixar-te esta noite. Noite, sim, pois o fato de levarem-te pela manhã faz-me desde já suplicar por aqueles minutos que povoam o espaço entre meu despertar e tua partida. Quero zelar tua presença! Noite à dentro lamber-te como cria.
Descerei a noite como uma dolorida escada - já simulando inconscientemente para onde serás levado. O calor que causa-me náuseas, faz do meu agosto um escárnio. E agora já é tarde... Gravo tua última doçura.
Ouço na tua voz - tal como miadinhos frágeis - um violino de súplica, diante das portas entreabertas. Sabes que podes abandonar-me de súbito, ficarei a esmo. Não o fazes porque, ainda que finja o contrário, também ficarás. Então volta-se para dentro da peça onde encontramo-nos: olhos egípsios piscando com paciência. Vens até mim... O peito branquíssimo pousa em minhas costelas.
Sinto meu coração fundir-se com TERROR - a melodia furiosa da orquestra acima de nós intensifica-se - alguém, imploro, arranque-me do teu calor! Da maciez! Aos primeiros raios de sol não estarás mais aqui! Não possuo mais poções de anestésicos para o café da manhã. És sombrio...Penosos tambores.
Não há como precaver-me para o pior. Meu suplício persistente, minha infindável tristeza- que torna-me ainda mais moribunda- é que Te amo. Negação da vida! Meu corpo é um deserto preenchido e levado ao vento. Já a alma é incendiária e após a morte física permanecerá a vagar pelos universos: que tão maravilhoso! Por que então não concede-me o fim sem mais demora, para continuar - ao teu lado - a caminhada em outro plano?
O amor dissecou minha matéria orgânica e a areia absorve o sangue injetado...
Delize, mesmo que só teu olhar, sobre mim... Quero ouvir tuas cordas vocais solfejarem.
Imagino-me sentindo tua presença ao meu lado, pois pode ser que quando partas nunca mais retornes. Por Deus, engasgo-me com a imponência da tua alma! Espírito antigo, tenho meu medo infantil ativado ao perder-te. Meu ateísmo nunca foi convicto, e ao sentir teu corpinho abraçado no meu questiono-me sem trégua. O elo perdido é o espírito!
É noite alta e tu há tempo engatinhastes até o hall do sono, e eu, por instantes aproximo-me, mas tenho deficiências de ímãs que permitam ao descanso agarrar-me. E ainda: acompanharei cada espasmo teu, cada suspiro que aterroriza-me baforando em mim tua ausência próxima...

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