Rumando para o vermelho. Protegendo-se de um inimigo invisível que cola no rosto das pessoas em volta. Escuta sussurros, quase que por completo indecifráveis - mas ainda é português. Apavora-se, não sabe como agir, não entende-se com ninguém para conversar. O que era começo de encontro pessoal, mudou rapidamente e ruiu para um bagaço seco. Assim mesmo, congelado, habitando a fria sibéria da alma.
Pensa coisas ridículas, como não estar perto de ninguém para não atrapalhar. Dorme onde pode remexer-se na inquietude sem incomodar o sono alheio. Sua liberdade é a solidão? Onde irá parar, sendo de lugar nenhum? Que compulsão por urinar incômoda! E pensar que quando pequena sonhava ter uma penteadeira, estilo cômoda de avó ou mãe. E mais um espelho com cabo bastava para a realização. Agora... se levantar para ir ao banheiro, suas pernas a levarão para os fundos - escuridão atraente.
Não sente sequer vontade de conversar, não consegue expressar-se! Porém, no início, não era isso o desejado? Ser sem sentimentos? Como pode tentar lutar contra sua essência? Alguém responda! Mesmo que estejamos bem de baixo de uma árvore enorme durante um temporal típico litorâneo, com seus encontros catastróficos de frentes frias e quentes, raios muito próximos, canivetes chovendo, goiabas podres despencando dos galhos - que pisoteia para aliviar o pânico.
Há uma rede na árvore, abrigando uma mulher de meia idade, tapada com um confortável cobertor, puxando assuntos com Lia, interessando-se por sua situação de vida em geral. Ela sofre há meia hora de dores incansáveis no peito. Vejo pura queridisse, buscando distração para a dor aguda cessar. Ao contrário de Lia, não está com medo. Ambas recolhidas na árvore, borrifando cheiro de goiaba para todos os lados. Como queria abraçá-la, transparecer que a adoro. Acho que nem Deus sabe o quanto gosta das pessoas especiais em sua passagem de trem pela terra. Não quer morrer sem que acreditem nela!
Faz coisas sem nexo algum pois não compreende o que dizem-lhe - é tudo tao complexo! Um maço de cartas embaralhadas! Importa-se muito com todos, algo a impede de demonstrar. Tentou dizer algumas palavras, mas quem acredita em uma desajustada? Anda pirada, sentindo-se fora da realidade, em desrealização quase que total. Por favor, perdoem-na, não é insuportável por que quer. Excesso de coquetéis molotov destruíram-na.
Não digam que está fechando o leque de seu horizonte. Suas relações com humanos amigos já são por si só complicadíssimas. Não suporta ceder seu abraço, seus lábios- repudia casualidades amorosas. Não desperta paixões, talvez admiradores, e só.
Claro que todos são diferentes e alguns não se entendem, mas Lia é um caso de deslocamento extremo. No trabalho, foi uma batalha contra os tremores, desmaios parciais, correntes de ar polar nas pernas - olhou para o ar condicionado, nada havia mudado. Só ela sentiu. Em que paralelo dimensional encontra-se? O que fará? Não sabe mais administrar onde vive, quem está por perto, os olhos macabros de desconhecidos na rua. No corredor, debocham de sua aparência distinta, sua fala enrolada, vendo-a como um vidro trincado. Vitral roxo rachado. Locomovendo-se com dificuldade para não beijar o chão...
A casa tem paredes de madeira e, ela jura de pés juntos: está escutando as pessoas conversando - o lugar tem as paredes de madeira. Uma reunião às escondidas. Perdeu a noção? Sabe apenas que gostaria de preservar quem ama ao seu lado... Mas não sabe mais como segurar a barra. O que decidirão fazer com ela?
É véspera de ano novo e está muito pior.
A cada período de surto a insanidade agrava-se : destrói mais um pedacinho de si. No fim, não haverá o que pôr em seu caixão - enterrem seus diários!
Ameaçadores seres, deixem-na virar nessa cama. Senhoras, não exaltem-se! Sinte terror de vozes vorazes.
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