quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Exílio parte 48

Estava indo embora, observando-te em silêncio, sabendo que após aquele encontro meu coração já não seria mais o mesmo. Pode ser só um sentimento ruim a menos, pois oscilo entre o entusiasmo e o sossego daquela paisagem em que coisa nenhuma pede urgência. Fiquei presa naquele infinito; mais nas longínquas vizinhas que não dormiam.
Somos daquelas pessoas que passam e se olham inevitavelmente, abrindo os olhos com um doce intencionado, tentando abraçar cada feixe de luz que do olhar escapa.
Experiências que respingam; anunciei-me tratando de não fugir aos dias. Minha cabeça é como o artista de circo que não descobre o equilíbrio para andar no canal enlameado. Sua o corpo, amarrota o sorriso e não importa-se de balbuciar como criança seus lamentos de sina. 
Nutro minha hera nos detalhes. Observações atrás da cavidade ocular que conectam-se aos campos do inaudível: persigo minha verdade emocionada oculta no frágil biombo do despertar de sensações. “A misteriosa fraqueza no rosto dos homens”, lembro de Sartre.
Atravesse a rua, como a senhorinha e sua bengala no meio fio, e te esperarei apedrejada para um próximo fim. Não sei alimentar-me na ausência de inebriamento; cada passo do garçom na madeira é uma sacolejante negação.
O bisturi da música opera. Já cravada a anestesia, fico sabendo quanto me custará: peço que ao menos avise Lia na sala de espera, já em desalento químico. Ela veio e trouxe a inibição. Trouxera consigo lascas de mucosa infeccionada e penso: amanhã doerá tanto mais!
Não saio e não rezo: espero. Pois seguindo a escola de Vinícius, não desperdiçarei uma gota de álcool sequer. Sobreviver a miséria… Uma labuta vinda da minha nudez, muito lustrosa e insípida, procurando ingenuidades no alto da sapatilha maternal onde não poderia ser menos inclusa nas maldades da vida. Nudez são as consequências? Imagino que nunca a tenhas feito.

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